Monday, April 29, 2013

Novas evidências do mecanismo de ação do CNP na cadeia do FGFR3


O FGFR3 e o CNP na placa de crescimento da cartilagem

Nos últimos dois anos, no mundo inteiro pessoas interessadas ​​em encontrar alternativas terapêuticas para as condrodisplasias
relacionadas à mutações do receptor de fator de crescimento de fibroblastos tipo 3 (FGFR3) e, especialmente, para a acondroplasia, têm prestado atenção ao análogo do peptídeo natriurético tipo C (CNP) BMN -111, que está atualmente em desenvolvimento clínico como uma terapia potencial para a acondroplasia.
 
O FGFR3 tem sido descrito como capaz de reduzir a capacidade dos condrócitos para proliferar e amadurecer a um estado chamado de hipertrofia (1,2; também revisto aqui). O FGFR3 atua através da ativação de uma série de reações químicas controladas no interior da célula, que costumamos denominar de cascatas ou vias (figura).



O CNP funciona inibindo uma das cascatas químicas mais importantes desencadeadas pela ativação do FGFR3, a via Ras-Raf-MEK-ERK (1,2; também comentado aqui). Estas siglas identificam um grupo de proteínas com propriedades químicas ativas e, por conseguinte, são chamadas enzimas (a via da mitogen activated protein kinase ou enzimas MAPK).

  A cascata MAPK, quando ativada pelo FGFR3 em condrócitos, a célula principal da placa de crescimento cartilaginosa, age como um freio no processo de crescimento ósseo e, assim, o FGFR3 é um controlador negativo natural do crescimento ósseo. Quando o FGFR3 está superativo, os condrócitos não podem multiplicar-se e amadurecer normalmente e menos tecido ósseo é criado, resultando em ossos mais curtos, especialmente os apendiculares (braços e pernas). Agora, você tem uma ideia de como uma mutação ativadora do FGFR3 leva à deficiência do crescimento ósseo vista na acondroplasia. Agora, vamos ver mais detalhadamente como as cascatas do FGFR3 e do CNP interagem dentro dos condrócitos.
 
Quando o CNP se liga ao seu receptor, chamado NPR-b, na membrana celular dos condrócitos, desencadeia uma cascata química que vai bloquear a cascata MAPK no nível da enzima Raf (figura). Neste caso, como as enzimas MAPK têm sua atividade reduzida, os outros mecanismos que controlam o crescimento do osso são, pelo menos parcialmente, restaurados, o condrócitos é novamente capaz de se multiplicar e amadurecer e o crescimento ósseo é resgatado. Isto é verdade em ratos e presumivelmente nos outros modelos de animais que foram expostos ao BMN-111. Atualmente não há nenhum artigo que descreva o efeito da administração do CNP em animais maiores, mas sabemos que, durante uma apresentação pública onde o programa BMN-111 foi anunciado, o desenvolvedor deste análogo do CNP revelou que macacos expostos cresceram mais que o esperado.
 


O mecanismo de crescimento ósseo é complexo

O crescimento ósseo é um processo muito complexo, onde os condrócitos na cartilagem da placa de crescimento entram em um programa rápido e extremamente dinâmico determinado pelos efeitos das reações causadas por moléculas locais e sistémicas (na maioria das vezes proteínas ou peptídeos). Quando você ler local, isso significa que a proteína ou o agente é produzido pelas células na placa de crescimento ou na vizinhança (por exemplo: FGFR3, CNP, PTHrP; veja os artigos anteriores do blog para mais detalhes). Sistêmico significa que o agente é produzido longe da placa de crescimento, tais como os hormônios da hipófise ou da paratiróide.
Um estudo mostra os efeitos do CNP no crescimento ósseo por outro ponto de vista

Um estudo recente, de Ono e colaboradores (3), e publicado na revista Human Molecular Genetics, adiciona mais complexidade a este processo. Os autores descrevem a função da proteína chamada neurofibromina, uma proteína comum, presente em várias células, nos condrócitos. O seu papel nos condrócitos não é completamente compreendido, bem como a sua relevância para o desenvolvimento apropriado da placa de crescimento. Os autores testaram um grande número de possíveis conexões que essa proteína poderia ter com alguns dos outros agentes de crescimento locais, entre eles o FGFR3, CNP, IHH e PTHrP.

O que é relevante neste estudo, quando se pensa em acondroplasia?

Eles descobriram que a neurofibromina exerce a sua função reguladora no desenvolvimento endocondral (é assim que os cientistas citam o processo pelo qual crescem os ossos longos, por meio do desenvolvimento da placa de crescimento da cartilagem, endochondral development), agindo como um inibidor da cascata MAPK do FGFR3 ativado. A neurofibromina tem algumas propriedades semelhantes a de outras enzimas denominadas GTPases (o sufixo ase descreve uma enzima) que reduzem naturalmente a atividade da enzima Ras, a primeira enzima ativada pelo FGFR3 na cascata MAPK. Neste estudo, os investigadores demonstraram que a ação da neurofibromina é semelhante ao efeito do CNP na cascata MAPK (revista aqui). Quando eles tiraram a neurofibromina das células, os condrócitos reduziram a sua proliferação e capacidade de maturação e os ossos cresceram menos, à semelhança do que acontece nos casos de mutações hiperativas do FGFR3. Quando eles injetaram CNP nos animais carentes de neurofibromina, o crescimento ósseo foi resgatado.

Além disso, observaram que os condrócitos mutantes (sem neurofibromina), também produziam menos a IHH, outro fator fundamental para o crescimento da cartilagem e do osso, e que por sua vez também é importante para a geração de PTHrP. Sabemos que IHH e PTHrP são muito importantes para o bom desenvolvimento da placa de crescimento (4; também revisto neste artigo do blog).

Poderíamos pensar que a superexpressão (ou superprodução) de neurofibromina poderia resgatar o crescimento ósseo na acondroplasia, mas isso seria muito difícil, já que a neurofibromina é uma proteína universal e sua desregulação (para mais ou para menos) poderia trazer efeitos indesejados ao indivíduo tratado. No entanto, este estudo traz à tona mais informações valiosas sobre como a MAPK atua nos condrócitos.
Para concluir, este estudo examina e confirma, entre outros resultados relevantes, como o CNP trabalha na placa de crescimento, trazendo mais evidências para seu uso em terapias potenciais para a acondroplasia.

Outros análogos do CNP no horizonte?

Outra informação relevante oferecida neste estudo está relacionada com o tipo de CNP que os investigadores utilizaram para realizar os testes. Eles escolheram um análogo diferente do CNP que eles chamaram de NC-2. O NC-2 tem uma meia-vida muito longa em comparação com o CNP (~ 20h vs. ~ 3 min) e é o resultado da montagem de uma parte da molécula do CNP com a parte básica de um anticorpo (que chamamos de parte Fc de uma imunoglobulina G, IgG). Ainda não consegui encontrar mais informações sobre este composto além do que está descrito no estudo de Ono e colaboradores, por isso há muitas perguntas a fazer sobre ele. Mas, pelo menos dois pontos são interessantes: com a estrutura descrita no seu trabalho, parece que o NC-2 é uma molécula grande (bem maior do que o CNP natural). Uma vez que ele mostrou funcionar nos testes realizados, pode-se perguntar se os pesquisadores observaram quaisquer efeitos tóxicos nos animais testados ou qualquer outra evidência de efeitos indesejáveis ​​sob a longa exposição ao NC-2. Por exemplo, é preciso lembrar que o BMN-111, o outro conhecido análogo do CNP, tem uma meia-vida de 20 minutos e provoca efeitos leves na pressão arterial (5).

O outro ponto é que a molécula chamada de FP-1039 (6), que mencionei no artigo anterior do blog, também é composta por uma parte Fc da IgG, e assim também é uma molécula grande. Já que o NC-2 parece atingir a placa de crescimento, seria interessante saber se o FP-1039 também alançou a placa de crescimento nas experiências feitas durante os testes com este composto.

Portas estão se abrindo.


Referências

  1. Horton W. Molecular pathogenesis of achondroplasia. GGH 2006; 22 (4): 49-54
  2. Foldynova-Trantirkova S et al. Sixteen years and counting: the current understanding of fibroblast growth factor receptor 3 (FGFR3) signaling in skeletal dysplasias. Hum Mutat 2012; 33:29–41.
  3. Ono K et al. The Ras-GTPase activity of neurofibromin restrains ERK-dependent FGFR signaling during endochondral bone formation. Hum Mol Genet 2013; 22(15): 3048–62. doi: 10.1093/hmg/ddt162.
  4. Kronemberg H. Developmental regulation of the growth plate. Nature 2003; 423: 332-6.
  5. Biomarin press release.  
  6. Harding TC et al. Blockade of nonhormonal fibroblast growth factors by FP-1039 inhibits growth of multiple types of cancer. Sci Transl Med 2013;5:178ra39. 




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